3.3 Documentos do cartório de 2º ofício Queiroz Rocha

No cartório de 2º oficio dei início à pesquisa em 2006 e teria continuado se houvesse mais tempo, em especial a consulta aos livros de notas. Esses documentos, datando do século XVIII, compreendem algumas dezenas de cartas de alforria e registros de doações. Em virtude da transferência do cartório para outro prédio, os Livros de Notas, referências tão importantes para a análise da escravidão em Quixeramobim, foram dadas como perdidas. O deslocamento de todos os documentos foi feito em caixas e sacos indistintamente e abrigados em um quarto com bastante umidade. Fiz uma intervenção nesse material indiferenciado e constatei que decorrido um ano de minha primeira visita, os documentos entraram em processo acelerado de decomposição.

Mesmo me faltando competência, ou melhor, uma formação em conservação e catalogação, procurei dar tratamento a essa pilha indiferenciada, tentando retirá-la da precariedade em que se encontrava. O desafio consistiu em separar grande parte do material que se encontrava nas caixas e sacos, fazer uma limpeza rápida e realizar uma classificação mínima, considerando pelo menos dois critérios, o da data e do tipo de documento. O trabalho, que durou uma semana, me possibilitou tomar conhecimento dos diferentes documentos – processos civis, autos criminais, inventários dentre outros - e a perceber que existe ali uma expressiva quantidade de documentos do século XVIII e que se não houver um interesse em conservá-los, muito da história do Ceará estará perdida.

A degradação e o desaparecimento de parte do material me inquietaram. Certamente isso deu outra dinâmica à pesquisa a ponto de não querer parar de buscar os tais Livros de Notas, onde se encontravam os registros de alforria. Nesse momento, o que me movia já não era só o interesse de pesquisador, mas uma consciência cívica de que era necessário salvar a memória histórica da escravidão no Ceará. Na verdade, em todo o percurso de pesquisa estive impelida para essa responsabilidade e nem poderia ser diferente, pois se reconhece na sociedade brasileira o descaso por essas memórias. A esse respeito, a atitude que mais notoriedade teve no Brasil, e que muitas críticas produziu, foi a de Rui Barbosa, primeiro ministro da Fazenda da República, que teria mandado queimar numerosos documentos sobre a escravidão. As circunstâncias e razões que o levaram a tal ato têm sido discutidas e reavaliadas, mas não deixa de ser um mau exemplo para uma sociedade a decisão de um indivíduo sobre o que deve ser mantido ou arquivado para as gerações futuras.

Graças a essa insistência, ainda consegui localizar alguns Livros de Notas do século XIX e identifique mais 22 cartas de alforrias, assim compondo com as do século XVIII um conjunto de 42 registros de manumissão.

Quadro 04: Cartas de alforria
Ano Quantidade %
1784-1790 21 50
1801-1803 9 21,42
1826-1827 12 28,58
Total 42 100

Fonte: Cartório de 2º Ofício de Quixeramobim