Capítulo 8
A vida associativa e os enjeux das normas

Eduardo Campos (1980) arrolou oitenta e seis confrarias no Ceará, com compromissos reconhecidos pelo poder civil, distribuídas nas quarenta freguesias da Província, no século XIX. Neste montante, encontravam-se vinte e sete irmandades do Santíssimo Sacramento; dez de Nossa Senhora do Rosário; sete das Almas, apenas para citar as de número mais expressivo. Apenas doze freguesias possuíam três ou mais confrarias. A capital Fortaleza liderava com doze agremiações, incluindo-se aí uma Santa Casa de Misericórdia; seguida por Sobral com seis; Aracati, Quixeramobim e Viçosa possuíam quatro irmandades302. A rigor os Negros se reuniam em torno da devoção de Nossa Senhora do Rosário, ora privando ora aceitando a participação de Brancos e de Pardos. O exclusivismo da veneração desses sujeitos apenas por um orago não é perceptível entre os Pardos visto que cultuavam tanto Nossa Senhora dos Prazeres e do Livramento como Nosso Senhor Bom Jesus do Bonfim303. Falo de exclusivismo devocional porque não se verificou se os Negros organizaram culto para outro santo, no Ceará. Existia uma única irmandade de São Benedito na Província, na freguesia de Viçosa, santo habitualmente venerado por esse grupo. Como não pude localizar o compromisso dessa irmandade, nada posso afirmar a seu respeito, por exemplo, se era uma confraria negra.
Em razão das restrições à participação de determinados componentes da sociedade, essas agremiações passaram a se constituir, estabelecendo diferenças sociais e raciais, nesse tocante seguindo o padrão importado de Portugal. Na impossibilidade de apresentar um quadro geral desse aspecto devido a dificuldade de acesso a todos os estatutos, considero oportuno destacar aqui algumas irmandades que não eram condescendentes à participação de escravos e de homens de cor no seu seio. No Ceará, as restrições das irmandades de Brancos em relação à aceitação de pessoas de outro grupo sócio-racial eram de três tipos: as que excluíam escravos, por conseguinte, as que só aceitavam homens livres; as que só admitiam Homens Brancos e as que privavam a entrada de Homens Pretos. No primeiro tipo a clivagem livre/escravo definia o estatuto social do participante. Já no segundo e terceiro, notadamente ampliando suas restrições, definia os membros pela cor branco/preto.
Considerando esses aspectos, enquadram-se no primeiro grupo as confrarias de Nossa Senhora da Piedade de Várzea-Grande, em Granja304, composta de “illimitado número (…) exceptuando-se: § 6º. Os Escravos”305; de Nossa Senhora das Dores da Matriz de Canindé306, que admitia “pessoas de ambos os sexos, não só desta como de qualquer outra freguesia, com tanto que possam pagar as contribuições que lhes são impostas. Excetuam-se porém: 1º. os escravos”307; a irmandade do Glorioso Santo Antônio da matriz de Boa Vista, composta de illimitado número de pessoas de ambos os sexos. Art. 2º. Exceptuam-se: § 3º. Os escravos”308; A irmandade de Nossa Senhora das Mercês, da Villa de Imperatriz, formada de “illimitado número de pessoas, de ambos os sexos, exceptuando-se: § 5º. Os escravos”309 e por fim a irmandade de São Francisco das Chagas, padroeiro da matriz de Canindé, composta de “pessoas livres de ambos os sexos, que tiveram a plena administração dos seus bens”310.
As instituições que reduziam as possibilidades de admissão ao grupo branco ampliavam às restrições a todos os demais grupos sócio-raciais, chegando a ser mais excludente do que as associações restritas aos homens livres e até do que as que proibiam a entrada de “homens da classe dos Pretos”. Nesse exemplo, encontrava-se a irmandade do Santíssimo Sacramento de Cachoeira, “composta de illimitado número de pessoas de um e outro sexo, que sejam brancas, e que tenham bons costumes, meios de decente subsistência, e que além de professar a religião católica, contém mais de quatorze anos de idade311. Finalmente no terceiro tipo encontravam-se a irmandade do Santíssimo Sacramento, instituída na Matriz de Nossa Senhora da Penha da cidade de Crato312 e a confraria de Nossa Senhora da Conceição da Capella da povoação de Messejana313, que não aceitavam nos seus quadros pessoas que pertenciam “à classe dos Homens Pretos”314. Embora com restrições aos “Pretos”, não há nenhuma indicação de que houvesse impedimento aos Mulatos e Pardos de acenderem à agremiação. O critério mais comum a todas elas, talvez o mais restritivo, era o de professarem a Religião Católica Apostólica Romana e que fossem pessoas idôneas e de bons costumes315.
Exigências econômicas também eram manifestadas nos compromissos, pois só podiam ter ingresso nas irmandades pessoas que tivessem plena administração dos seus bens, ou meios decentes de subsistência e ainda que pudessem pagar as contribuições impostas. Os compromissos estipulavam os valores das contribuições que os irmãos deveriam ceder no ato de sua entrada na agremiação. Essas contribuições, designadas de jóias, eram pagas pelos que assumiam cargos administrativos e cargos por devoção e o confrade que não cumprisse com suas obrigações nesse tocante sofria severas restrições, dentre estas, até a de expulsão. Além dessa contribuição, todos eram obrigados a pagar anuidades, sendo com elas que a instituição atendia às necessidades dos filiados, zelava a capela, pagava seus funcionários (zelador e vigário) e mantinha suas despesas em dia. O critério econômico tinha um peso não somente em função das anuidades e do capital que muitas acumulavam, mas porque se organizando em confrarias mais ricas, os irmãos tinham aí a sua situação socioeconômica refletida. Levando a efeito esse entendimento e resguardando as particularidades estruturais e conjunturais dos contextos nos quais as irmandades se inscreviam, penso que faz sentido para as confrarias do Ceará, o que J. J. Reis (2009) argumentou para as baianas, no seu dizer que

‘Na ausência de associações propriamente de classe, elas ajudavam a tecer solidariedades fundamentadas na estrutura econômica, e algumas não faziam segredo disso em seus compromissos quando exigiam, por exemplo, que seus membros possuíssem, além da adequada devoção religiosa, bastantes bens materiais. Mas o critério que mais freqüentemente regulava a entrada de membros nas confrarias não era ocupacional ou econômico, mas étnico-racial316.’

De certo modo, a capacidade econômica das confrarias era revelada através da indumentária e dos símbolos que portavam. Nesse ponto também os estatutos traziam recomendações dos adornos e cores obrigatórios aos ocupantes da mesa regedora e demais irmãos quando em manifestações públicas e outros atos solenes como enterramento, acompanhamento de uma procissão ou a celebração de uma missa e, sobretudo durante a festa da padroeira. Nessa ocasião não apenas portavam suas opas, fossem brancas, vermelhas, roxas ou azuis, mas seus cajados e insígnias que poderia ser um crucifixo, uma vara de prata ou uma medalha de Nossa Senhora do Rosário. As insígnias serviam para indicar o cargo ocupado pelo irmão bem como para diferenciá-los internamente.

‘São obrigados todos os irmãos, que se acharem no lugar, a assistir de opa a todos os actos de religião e piedade em que funcionar a irmandade em sua capella, e bem assim a festa de Santo Antônio, Padroeiro desta freguesia e a da Semana Santa, as procissões mais actos em que for preciso sua assistência para cujo fim será convocado pelo thesoureiro317. ’

A irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Crato, cujos compromissos foram reconhecidos em 1870, era composta de dois núcleos: um formado de “homens e mulheres livres de todas as cores” e o outro constituído por todos os “Pretos escravos”, quando não houvesse impedimento dos seus senhores. A mesa regedora seria escolhida no primeiro grupo e do segundo grupo sairia o séquito régio318. Essa configuração não impedia a nomeação de juízes e juízas no segundo grupo “que além de tarja, ou banda nacional, usarão de pequenos cajados enfeitados, e trarão pendentes ao collo a imagem de Nossa Senhora do Rosário, segura à uma fita larga de seda branca”319. Já a insígnia do juiz da irmandade do Santíssimo Sacramento de Quixeramobim era uma vara de prata, devendo ser por ele conduzida tanto em funções internas, como nas assembléias-gerais, e em funções externas como acompanhamento de um funeral.
O aspecto econômico é um ponto interessante de comparação para entender as particularidades das agremiações. Por exemplo, as formadas supostamente por Brancos só aceitavam pessoas que tivessem plena administração de seus bens ou possuíssem meios decentes de sobrevivência320, já as confrarias negras permitiam o acesso dos pobres, o que deveria ser a condição econômica da grande maioria de seus componentes. Tampouco impedia que os ricos engrossassem as fileiras da agremiação, mesmo sendo uma participação reduzida a alguns cargos. Quanto aos direitos (missas, sufrágios, enterramento acompanhado da irmandade, esquife e outros), disso não seria privado por causa da cor, posto que eram as anuidades pagas, a garantia para recebimento da assistência na hora necessitada.
Ademais, os irmãos não poderiam ser adeptos de outra fé senão a católica apostólica romana e deveriam ser pessoas idôneas ou de bons costumes aos olhos da sociedade. Se fossem condenados pela justiça, só poderiam aceder à organização depois de passada a sentença. Os loucos ou “desassisados” jamais poderiam ter assento em qualquer que fosse a agremiação leiga. Ainda que tivessem algumas pequenas variações, algumas limitavam a idade de ingresso em dezoito anos para os homens e catorze para as mulheres. Restrição à participação de mulheres não foi observada e em alguns casos elas assumiram cargos na mesa regedora e compunham o grupo dos irmãos honorários. Por exemplo, a irmandade do Santíssimo Sacramento da freguesia de Quixeramobim, elegia duas mesas, a regedora e a honorária. As mulheres eram votadas para assumir cargos de juíza, escrivã e de mordoma na segunda. Conforme os estatutos aprovados em 1885, os ocupantes dos cargos da mesa honorária eram eleitos depois da mesa regedora e “se distinguirão pela expressão qualitativa – por devoção321”.
As irmandades de Nossa Senhora do Rosário eram as únicas que permitiam a participação de escravos, de forros e de homens de cor. Na verdade, outra finalidade essas instituições não teriam senão a de congregar esses sujeitos, procurando assistir-lhes na suas necessidades espirituais e materiais. Analisando os compromissos de quatro irmandades (Crato, Icó, Sobral e Quixeramobim), observa-se que nos critérios de composição em muito elas se diferenciavam das demais, contudo guardavam semelhanças, a começar pela fé católica professada. A agremiação de Icó aceitava nos seus quadros “pessoas de ambos os sexos, Pretos, forros e escravos e não instituía restrição à participação “de pessoas de outras cores, com tanto que professem a religião catholica apostólica romana322. A confraria do Rosário de Crato menciona esse ponto nos termos seguintes: “A irmandade de Nossa Senhora do Rosário nesta cidade (…) tem por fim principalmente, quando lhe for possível, o culto católico, sob a mesma invocação, e erigir nesta cidade, em lugar conveniente, a capella da mesma Senhora”323. (Grifos meus).
A associação de Nossa Senhora do Rosário da povoação da Lapa também permitia o acesso de escravos, forros, Homens Pretos e de todas as demais cores que nela desejassem ter ingresso e até de todas as condições. Ainda aceitava como “irmãs ad honorem as mulheres escravas e livres de todas as cores”324. Como nas outras, a escolha da mesa regedora era realizada por escrutínio, procedimento igualmente adotado para eleger seus reis e rainhas. O número de irmãos da irmandade de Nossa Senhora do Rosário era ilimitado, não havendo restrição quanto ao sexo. Conquanto admitindo todas as cores e condições sociais, a associação dava exclusividade aos Negros nos cargos administrativos, porém isso se modificará no decorrer do século XIX
Diante da descrição da composição das irmandades de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, ainda pode-se depreender que elas possuíam estrutura administrativa similar às outras irmandades fossem de Pardos ou Brancos, constituída por uma mesa diretora, composta de juiz, escrivão, tesoureiro, procurador, secretário e outros membros. Para compor a mesa, geralmente fazia-se eleição a cada ano no dia da festa do orago ou em outra data indicada também nos estatutos. As obrigações estatuídas abrangiam assistência espiritual e material aos seus confrades bem como auxílio social aos mais pobres. A morte, igualmente, era preocupação constante dos membros da comunidade negra, por isso, a irmandade procurava assistir a seus semelhantes, dando-lhes um lugar para o sepultamento com esquife e mandando-lhes rezar missas.
Era comum a coroação de rei e rainha por ocasião da festa da padroeira, mas “podendo desfilar e comemorar, em ocasião de atos mais solenes, com indumentos, flagrante imitação às vestes do poder régio”325. A festa do orago era o momento alto das festividades das irmandades do Rosário no Ceará. Além desta, organizavam seu calendário litúrgico conforme as festividades católicas, participando de celebrações do padroeiro da freguesia, Semana Santa e Natal. O evento comemorativo do santo envolvia missa, coroação dos reis negros e cortejo com dramatização. Esse ponto será mais bem descrito adiante.
Igualmente, da análise dos compromissos das irmandades negras depreende-se que, quanto aos cargos administrativos (tesoureiro, procurador, juízes) parecia não haver muitas diferenças entre elas e as demais, salvo no que diz respeito à eleição de reis, rainhas e corte. Restrição ao sexo não havia e tampouco se fechava completamente a participação de “pessoas de outras cores”. Ainda que acolhessem pessoas dos mais variados segmentos sociais, não deixavam de demarcar o espaço que ocupava com base na restrição da presença de Brancos. A cláusula do compromisso da irmandade do Rosário de Quixeramobim que versa sobre a composição da mesma, dava exclusividade aos Pretos na administração, embora abrisse exceção para o tesoureiro. Isso não deixa de ser um elemento importante para se pensar nas representações elaboradas por essas instituições negras com a finalidade de construir e afirmar sua diferença.
O primeiro compromisso da irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Quixeramobim, que teve sua aprovação em 16 de outubro de 1854, se estrutura em nove capítulos: composição da irmandade, da eleição, da presidência, das obrigações do tesoureiro e procurador, das obrigações, das festividades, dos sufrágios, das alfaias e disposições gerais. Esses nove capítulos se desdobram em vinte e três artigos. O capítulo sobre a composição da irmandade indicava critérios de raça, sexo e posição econômica, atribuindo exclusividade aos Pretos para a administração com exceção do cargo de tesoureiro que poderia ser assumido por um Branco cuja responsabilidade se estendia pela prestação de conta do patrimônio da irmandade e pela administração da capela. Previa-se então que nem Branco e nem Pardo assumiriam cargos administrativos na mesa regedora326.
O cargo de tesoureiro, facultado aos Brancos, exigia além da responsabilidade com a capela, provendo-a de tudo que fosse necessário para o culto divino, guardar as alfaias e ornamentos pertencentes à irmandade, ação que estava subordinada a anuência da mesa regedora ou do presidente, pois o tesoureiro não podia dispor dos bens ao sabor dos seus desejos. Já o procurador tinha por obrigação arrecadar os dinheiros pertencentes à irmandade, receber anuidades, esmolas e, além do mais, passar tudo para a responsabilidade do tesoureiro. Os outros irmãos da confraria teriam que fazer cumprir a norma de prover a irmandade de suas anuidades, incorrendo em expulsão caso deixassem de cumprir essa obrigação por três anos.
Muitas vezes os estatutos discriminavam o montante de multas que os participantes deveriam pagar caso não cumprissem seus compromissos com a irmandade, principalmente no que se refere à contribuição e à falta de assiduidade nas reuniões. Em algumas irmandades como a do Rosário dos Pretos de Crato, o estatuto aprovado em 1870 indicava a quantia com que cada membro da mesa deveria entrar, podendo haver variação quando houvesse festa do orago. O membro que fosse eleito rei ou rainha, em alguns casos, pagava quantia superior aos integrantes da mesa, ainda que assumisse o cargo por devoção.
O estatuto da irmandade reservava capítulo às festividades religiosas. No compromisso da irmandade de Quixeramobim estava estipulado que a festa da padroeira devia ser realizada todo ano durante o mês de dezembro com novena começando no dia 18 e terminando no dia 26327. Ficava obrigada a celebração da missa no dia 27 com exposição do Santíssimo Sacramento328. Sobre esse ponto o livro de registro de receitas e despesas dá uma idéia dos tipos de gastos que eram feitos nessa ocasião. Além dos ornamentos ou alfaias aparecem gastos com pólvora, supostamente para confecção de fogos, música e com o vigário pela assistência da festa e procissão.
No que respeita à escolha do séqüito e à realização da festa, instituíam-se desde a data da festa ao tipo de indumentária que deveria ser usada pelo irmão em ocasiões de solenidade pública. Para tal evento se despenderia “os dinheiros precisos” como determinava a irmandade de Quixeramobim. A solenidade ainda poderia ser feita em conformidade com as forças da irmandade, autorizando-se a utilização “do produto das duas eleições, e do leilão feito para o auxílio da festa, e se isto não for suficiente, a mesa dará suas ordens para se tirar do cofre o que faltar329”, como previa o estatuto da irmandade de Icó.
Para a eleição do rei e da rainha, como por exemplo, em Crato, estabelecia-se uma separação entre Negros escravos e livres. Os escravos não participavam da mesa diretora, sendo seu engajamento restrito ao séqüito régio e ainda condicionado à permissão de seus senhores. O rei deveria usar em atos solenes a coroa, o cetro, e o manto além de cingir a espada. O rei e rainha tinham ainda que usar a tira-colo “bandas de cores nacionais”. Em Icó, ainda que houvesse eleição de rei e rainha, os estatutos aprovados em 1870 não versam sobre como seria o processo. Sobre a festa diz apenas que ela aconteceria “todos os anos no dia 27 de dezembro ou em outro qualquer dia, quando por alguma circunstância não se possa fazer naquele”330
As normas e regulamentos que regiam as irmandades e suas práticas poderiam ser entendidos como estruturas sociais. Tais estruturas definiam o papel e a posição de cada sujeito no espaço social. Possivelmente tais posições eram negociadas com base em uma economia de bens simbólicos, mas não era descartado que bens materiais fossem critérios considerados para definir tais posições. Já me reportei às cláusulas dos estatutos que determinavam o montante que cada pessoa que desejava participar da irmandade, e dos cargos que pleiteavam, deveria dispor. Isso me leva a recuperar o conceito de habitus que é “ao mesmo tempo um sistema de esquemas de produção de práticas e um sistema de esquemas de percepção e apreciação de práticas. E, nos dois casos, suas operações exprimem a posição social em que foi construído”331.
Tais normas pareciam expressar o desejo de orientar a ação dos seus membros. Conforme Mariza de Carvalho Soares (2000), “as irmandades eram uma das poucas vias sociais de acesso à experiência da liberdade, ao reconhecimento social e à possibilidade de formas de autogestão, dentro do universo escravista”332. O gerenciamento das irmandades era controlado por mesas diretoras orientadas por normas. Os devotos que quisessem ter entrada na agremiação deveriam se apresentar à mesa, momento no qual ele ficava conhecendo suas obrigações333. No caso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos de Icó era prevista a assinatura de um termo onde o devoto obrigava-se a pagamento de contribuições. Se fosse um escravo aquele que tivesse interesse em participar da irmandade, deveria trazer por escrito, do seu senhor, a garantia de pagar as contribuições previstas.

Notes
302.

E. Campos, As irmandades Religiosas do Ceará Provincial. Fortaleza: Secretaria dos de Cultura e Desportos, 1980. p. 114-119.

303.

Nos estatutos e referências consultadas, a palavra normalmente vem grafada Bom Fim. Como se trata de um nome próprio, preferi atualizar para a grafia Bonfim.

304.

Está localizada a Oeste do Ceará.

305.

Resolução 1388 de 27 de dezembro de 1870, Leis Provinciais do Ceará 1835-61; 1862-73, Fortaleza: Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

306.

Canindé localiza-se ao norte do Ceará. A povoação de Canindé fazia parte do termo de Fortaleza em 1817 e é provável que quando do reconhecimento dos estatutos em 1862 já fosse termo ou município autônomo.

307.

Resolução 1048 de 21 de dezembro de 1862.

308.

Resolução 1370 de 26 de novembro de 1871.

309.

Resolução 1370 de 26 de novembro de 1871, in: Leis Provinciais do Ceará 1835-61; 1862-73, Fortaleza: Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

310.

Resolução 1379 de 28 de novembro de 1870.

311.

Resolução 1377 de 26 de novembro de 1870.

312.

Crato está localizado a sul do Ceará.

313.

A povoação ou vila de Messejana fazia parte do termo de Fortaleza. Situa-se a norte do Ceará.

314.

Resolução nº. 1050 de 24 de dezembro de 1862 e Lei nº. 1406 de 9 de agosto de 1871, respectivamente. Leis Provinciais do Ceará 1835-61; 1862-73, Fortaleza: Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

315.

Resolução nº. 1050 de 24 de dezembro de 1862.

316.

J. J. Reis, op. cit. 2009, p. 53.

317.

Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Quixeramobim. Lei nº 678 de 16 de outubro de 1854, In: Leis Provinciais do Ceará 1835-1861,Fortaleza, Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

318.

J. J. Reis, op. cit., 2009, p. 53.

319.

Resolução nº 1371 de 26 de Novembro de 1870, Leis Provinciais do Ceará 1835-61; 1862-73, Fortaleza, Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

320.

A irmandade de São Francisco de Canindé e a irmandade do Santíssimo Sacramento de Cachoeira, respectivamente.

321.

Compromisso de Confraria do Santíssimo Sacramento da freguesia de Quixeramobim, Comissão de Negócios Eclesiásticos, Provisão de 31 de outubro de 1885, Fortaleza.

322.

Resolução nº 1369 de 26 de novembro de 1870), Leis Provinciais do Ceará 1835-61; 1862-73, Fortaleza: Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

323.

Resolução nº 1371 de 26 de Novembro de 1870, Leis Provinciais do Ceará 1835-61; 1862-73, Fortaleza: Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

324.

Resolução nº 1371 de 26 de Novembro de 1870.

325.

E. Campos, As irmandades religiosas no Ceará Provincial, Fortaleza, Secretária de Cultura e Desporto, 1980, p. 37.

326.

Insisti em outro momento desse texto que essa exclusividade vai sendo construída uma vez que nos primórdios parecia que a administração do patrimônio estava nas mãos de não-Pretos.

327.

A data da festa será modificada nos compromisso seguintes para outubro.

328.

Resolução 1369 de 26 de agosto de 1870, Leis Provinciais do Ceará 1835-61; 1862-73, Fortaleza, Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.

329.

Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Icó, in, E. Campos, op. cit., 1980, p. 59.

330.

Ibid.

331.

P. Bourdieu, Espaço Social e Poder Simbólico, In: Coisas Ditas, São Paulo, Brasiliense, 1990.

332.

M. de C. Soares, Os devotos da cor,Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2000.

333.

Ainda que não se possa dizer que isso estava previsto em todos os compromissos consultados, especialmente os de Icó, Quixeramobim e Crato.