9.4.1 Ganhos e gastos

A irmandade estava obrigada a constituir um patrimônio para a capela de Nossa Senhora do Rosário. Como foi destacado linhas atrás, os “irmãos Pretos” começaram a constituí-lo no século XVIII, ainda quando tinha apenas uma imagem da santa para a qual pretendiam erigir um templo. As terras adquiridas a partir de 1760 deram uma base econômica sólida à irmandade, ainda que os foros por elas pagos não fossem suficientes para manter os gastos que foram se avolumando com as festas.

Figura 09: Despesas referentes ao ano de 1858
Figura 09: Despesas referentes ao ano de 1858

Foto: Livro de receita e despesa da confraria de Nossa Senhora do Rosário de Quixeramobim, 1833-1887. Analucia S. Bezerra Quixeramobim, 2006.

O montante de cinqüenta registros de aforamento, localizados na paróquia de Quixeramobim, indica de certo modo que as receitas obtidas pela confraria vinham necessariamente das rendas obtidas com os foros das terras alugadas quer fossem na vila ou nas fazendas. Contudo, não era daí que vinha o grosso de suas receitas e sim das esmolas de devotos, das contribuições dos confrades e dos rendimentos da bolsa406. Um exemplo apenas a titulo de ilustração. Em 1858, o sítio do Rosário trouxe para os cofres da irmandade 3$000 mil réis, os foros de outros terrenos 11$320 mil réis enquanto as esmolas e as contribuições responderam por um montante de 272$720 (vide listas de despesas e receitas de outros anos no anexo impresso e no CD).

Figura 10: Despesas referentes ao ano de 1858
Figura 10: Despesas referentes ao ano de 1858

Foto: Livro de receita e despesa da confraria de Nossa Senhora do Rosário de Quixeramobim, 1833-1887. Analucia S. Bezerra Quixeramobim, 2006.

Por outro lado, esses documentos revelam o papel que a irmandade exercia na economia local ao possibilitar o domínio útil de terrenos de morada e de comércio na vila; o domínio de parcelas de terras onde se poderia vir a cultivar agricultura ou delas se extrair recursos naturais como madeira e borracha407. A confraria adquiria com suas receitas, em praça local, objetos de manutenção das suas propriedades, como enxada, machado e outros, bem como aumentava o seu patrimônio com a aquisição de poldros, novilhos e outros animais. O contrário também era verdade, isto é, quando as receitas não cobriam as despesas, também se procedia, muitas vezes, à venda de animais.
O acompanhamento da irmandade ao enterro e o aluguel do esquife para pessoas não pertencentes à associação, mesmo que fossem escravos, era uma fonte de recursos, não chegando, contudo, a vir daí os maiores rendimentos. Garantiam boas entradas nos cofres das irmandades as esmolas em ouro como a que “Thereza Maria de Jesus, conhecida Maria Thereza do Canto duo a Nossa Senhora do Rosário hum rosário de ouro” e casas. Nossa Senhora do Rosário era pelo menos proprietária de três casas na sede de Quixeramobim. O dinheiro e pertences valiosos eram guardados no cofre cujas chaves, em número de três, ficavam uma com o juiz, uma com o escrivão e outra com o tesoureiro408.
Os compromissos estipulavam as contribuições de entrada e as anuidades dos confrades de onde se obtinha a maior parte das receitas. Essa obrigação, caso não fosse realizada a contento, poderia levá-los ao desligamento da irmandade. As jóias eram então estipuladas conforme a função que cada membro assumia e em se tratando da irmandade do Rosário não eram contribuições as mais onerosas. Contudo, é fato que isso dificultava o acesso dos irmãos à mesa regedora, principalmente dos escravos que dependia muitas vezes do proprietário para cumprir as obrigações com a associação, cargos para os quais se estipulavam cotas maiores.

Notes
406.

No compromisso de 1854 não há referência ao cargo de irmão esmoler, mas é provável que os rendimentos da bolsa fossem o resultado de peditório. Os irmãos esmoleres vão aparecer somente no compromisso.

407.

A mesa da irmandade de Nossa Senhora do Rosário, reunida em 1899, na pessoa de Julião Barrozo, pediu autorização ao bispo diocesano para proceder a venda de um sítio localizado na serra de Santa Maria, abundante em seringais, alegando dificuldade de fazer face à invasão dos vizinhos. (Vide documento anexo).

408.

Compromisso da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário de Quixeramobim. Lei nº 678 de 16 de outubro de 1854, In: Leis Provinciais do Ceará 1835-1861,Fortaleza, Biblioteca Pública Menezes Pimentel, Microfilme.